sábado, 29 de dezembro de 2007
sexta-feira, 28 de dezembro de 2007
Ele agarrou-lhe na mão, e ela agarrou-lhe na mão,
e ficaram de mãos agarradas, primeiro a olharem para as mãos,
depois levantando lentamente os olhos,
=
que por fim se encontraram,
perdendo-se uns nos outros, sem já saber quem via ou era visto,
os olhos ao mesmo tempo a verem e a serem vistos, nus,
sem qualquer pudor, como se tudo fosse possível uma vez mais,
=uma última vez, sem esquecer que o que lhes estava a acontecer
=
é impossível, quanto mais esquecer.
Pedro Paixão
Porque há momentos que são inesquecíveis
Inventa a eternidade na simples comoção de olhar uma estrela.
Basta que a olhes pela primeira vez,
=
depois de a teres olhado inúmeras vezes.
E, então, não precisarás de nenhum deus que
=
te ponha a mão no ombro e diga estou aqui.
Uma estrela espera-te desde toda a eternidade.
Procura-a. E vê se a não perdes durante a vida inteira.
A tua estrela pode não estar no céu.
Põe-na lá.
Vergilio Ferreira
quarta-feira, 26 de dezembro de 2007
segunda-feira, 24 de dezembro de 2007
domingo, 23 de dezembro de 2007
Nada mais urgente que um poema
para os que andam sós pelas avenidas universais
ou para os que andam sós mesmo que não o saibam
=
(acreditando-se em companhia por verem
(acreditando-se em companhia por verem
cheias as mesas, cheias as casas, cheios os copos)
ou para os que carregam nos ombros o fardo
de buscarem nas ruas seu metro de individualidade
e seu quilo de dignidade.
=
Walter Cabral de Moura
Walter Cabral de Moura
sexta-feira, 21 de dezembro de 2007
quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
Meninos de todas as cores
Era uma vez uma menina branca chamada Clara,
que vivia numa terra de crianças brancas e dizia:
É bom ser branca
porque é branco o açúcar, tão doce,
porque é branco o leite, tão saboroso,
porque é branca a neve, tão linda.
Mas certo dia a menina partiu numa grande viagem e
chegou a uma terra onde todas as crianças eram amarelas.
Arranjou uma amiga chamada Flor de Lótus, que,
como todos as crianças amarelas, dizia:
É bom ser amarela porque é amarelo o Sol
e amarelo o girassol, mais a areia da praia.
A menina branca meteu-se num barco para continuar a sua viagem
e parou numa terra onde todas as crianças são pretas.
Fez-se amiga de um pequena caçadora chamado Lumumba que,
como as outras crianças pretas, dizia:
É bom ser preta como a noite
preto como as azeitonas
preto como as estradas que nos levam para toda a parte.
A menina branca entrou depois num avião,
=
que só parou numa terra
onde todos as crianças são vermelhas.
Escolheu para brincar aos índios
=
uma menina chamada Pena de Águia.
E a menina vermelha dizia:
É bom ser vermelha da cor das fogueiras
da cor das cerejas e da cor do sangue bem encarnado.
A menina branca foi correndo mundo
até uma terra onde todos as crianças são castanhas.
Aí fazia corridas de camelo
=
com uma menina chamado Alin, que dizia:
É bom ser castanha
como a terra do chão, os troncos das árvores
é tão bom ser castanha como um chocolate.
Quando a menina voltou à sua terra de crianças brancas, dizia:
É bom ser branca como o açúcar
amarelo como o Sol
preto como as estradas
vermelho como as fogueiras
castanho da cor do chocolate.
Enquanto, na escola,
=
as crianças brancas pintavam em folhas brancas
desenhos de crianças brancas,
ela fazia grandes rodas com crianças sorridentes de todas as cores.
Luísa Ducla Soares
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
O amor é
criar no peito uma cidade de paz
para proteger o ser amado
O amor é
passar a vida inteira a gostar de alguém
O amor é um lugar quentinho
que a ternura faz morada
O amor é
leve como uma pluma
te coloca no alto como se uma torre fosse
te mantêm aquecido como um ninho
doce como o mel
floresce o ano todo um jardim de Amor- Perfeito
O amor é
beijar os dedos, lançar ao vento
acreditando que chegará ao seu destino
O amor é
palavra perfumada
que guarda cheiro para a vida toda
Marcadores: Imagens de : Manan Vatsyayana / Nysia / Irisz Agocs e Internet
Postado por Kiss with Apple às 18:21
terça-feira, 18 de dezembro de 2007
Não quero ser triste
Como o poeta que envelhece
Lendo Maiakovski na loja de conveniência
Não quero ser alegre
Como o cão que sai a passear
Com o seu dono alegre
Sob o sol de domingo
Nem quero ser estanque
Como quem constrói estradas e não anda
Quero no escuro
Como um cego tactear estrelas distraídas
Zeca Baleiro
sexta-feira, 14 de dezembro de 2007
Quarto Motivo da Rosa
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.
=
Cecília Meireles
Primeiro Motivo da Rosa
Vejo-te em seda e nácar,
e tão de orvalho trêmula, que penso ver, efêmera,
toda a Beleza em lágrimas
por ser bela e ser frágil.
Meus olhos te ofereço:
espelho para face
que terás, no meu verso,
quando, depois que passes,
jamais ninguém te esqueça.
Então, de seda e nácar,
toda de orvalho trêmula, serás eterna. E efêmero
o rosto meu, nas lágrimas
do teu orvalho... E frágil.
Cecília Meireles
Para onde é que vão os versos
que às vezes passam por mim
como pássaros libertos?
Deixo-os passar sem captura,
vejo-os seguirem pelo ar
- um outro ai, de outros jardins...
Aonde irão? A que criaturas
se destinam, que os alcançam
para os possuir e amestrar?
De onde vêm? Quem os projeta
como translúcidas setas?
E eu, por que os deixo passar,
como alheias esperanças?
Cecília Meireles
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
Não soube compreender coisa alguma!
Devia tê-la julgado pelos atos, não pelas palavras.
Ela me perfumava, me iluminava...
Não devia jamais ter fugido.
Devia ter-lhe adivinhado a ternura sob os seus pobres ardis.
São tão contraditórias as flores!
Mas eu era jovem demais para saber amar.
Antoine de Saint-Exupéry
Tivesse eu as roupas bordadas do paraíso,
Tecidas com luz dourada e prateada,
O azul e o escuro e os negros panos da noite,
E a luz e as metades - luzes,
Eu espalharia essas roupas sob os teus pés.
Mas, sendo pobre, tenho apenas os meus sonhos.
Eu tenho espalhado os meus sonhos sob os teus pés.
Por isso, pise suavemente;
Afinal, você está andando sobre os meus sonhos.
Willian Butler Yeats
A pobre flor dizia à borboleta: não fujas!
Vê como os nossos destinos são diferentes,
Eu fico, tu partes!
Todavida, nos amamos,
Vivemos sem os homens e longe deles,
Somos parecidos e dizem que ambas somos flores!
Mas, infelizmente!
o ar te transporta e a terra me prende.
Destino cruel!
Eu gostaria de perfumar o teu vôo
Com a minha respiração no céu!
Mas não, tu vais demasiado longe
Entre as flores sem número tu voas,
E eu fico sozinha
A ver minha própria sombra girar aos meus pés.
Foges, depois voltas,
Vai-te embora outra vez
E brilhas algures!
Por isso me encontras sempre
Em cada madrugada
Orvalhada em lágrimas!
Ah! para que o nosso amor possa
Viver dias de felicidade,
Ó meu amor
Ganha raízes como eu,
Ou dá-me asas como tu!
Victor Hugo
sexta-feira, 7 de dezembro de 2007
Entre o sono e o sonho,
Entre mim e o que em mim me suponho,
Corre um rio sem fim.
Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.
Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.
E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre
Esse rio sem fim.
Fernando Pessoa
quinta-feira, 6 de dezembro de 2007
Eu fui para uma floresta de nogueiras,
Porque minha mente estava inquieta,
Eu colhi e limpei algumas nozes,
E apanhei uma cereja, curvando o seu fino ramo;
E, quando as claras mariposas estavam voando,
Parecendo pequenas estrelas, flutuando erráticas,
Eu lancei framboesas, como gotas, em um riacho
E capturei uma pequena truta prateada.
Quando eu a coloquei no chão
E fui soprar para reativar as chamas,
Alguma coisa moveu-se e eu pude ouvir,
E, alguém me chamou pelo meu nome:
Apareceu-me uma jovem, brilhando suavemente
Com flores de maçãs nos cabelos
Ela me chamou pelo meu nome e correu
E desapareceu no ar, como um brilho mais forte.
Talvez eu esteja cansado de vagar em meus caminhos
Por tantas terras cheias de cavernas e colinas,
Eu vou encontrar o lugar para onde ela se foi,
E beijar seus lábios e segurar suas mãos;
Caminharemos entre coloridas folhagens,
E ficaremos juntos até o tempo do fim do tempo, colhendo
As prateadas maçãs da lua,
As douradas maçãs do sol.
William Butler Yeats
quarta-feira, 5 de dezembro de 2007
Há hoje um silêncio
que é feito de horizontes.
Minha mente, antes nua,
percebendo preencheu-se
dessa poesia indispensável,
que vive além dos telhados.
Minha alma já sentiu
não haver urgência alguma
para as folhas amarelas
que se desprendem das árvores,
forrando as pedras das ruas.
Adoro esse silêncio...
nele palavras não se vergam,
voam reto em brancas nuvens,...
voltam leves aos meus dedos,
precedidas de altos sonhos.
Ah! Quem dera fosse
também indivisível...
o breve tempo das tardes,
onde todas as frases são versos
nos corpos entrelaçados.
A flor que és, não a que dás, eu quero.
Porque me negas o que te não peço.
Tempo há para negares
Depois de teres dado.
Flor, sê-me flor! Se te colher avaro
A mão da infausta esfinge, tu perere
Sombra errarás absurda,
Buscando o que não deste.
Rita Costa
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
Quinto Motivo da Rosa
Antes do teu olhar, não era,
nem será depois, - primavera.
Pois vivemos do que perdura,
não do que fomos. Desse acaso
do que foi visto e amado:- o prazo
do Criador na criatura...
Não sou eu, mas sim o perfume
que em ti me conserva e resume
o resto, que as horas consomem.
Mas não chores, que no meu dia,
há mais sonho e sabedoria
que nos vagos séculos do homem.
Cecília Meireles
domingo, 2 de dezembro de 2007
Assim que anoiteceu, saiu para pescar.
Peixes não, estrelas.
Afastou-se da casa, atravessou um campo até o seu limite.
Na linha do horizonte, sentado à beira do céu,
abriu a caixa das frases poéticas que havia trazido como iscas.
Escolheu a mais sonora, prendeu-a firmemente na rebarba luzidia.
Depois, pondo-se de cabeça para baixo, lançou a linha no imenso
=
azul, deixando desenrolar todo o molinete.
E paciente, enquanto a Lua avançava sem mover ondas, começou
E paciente, enquanto a Lua avançava sem mover ondas, começou
=
a longa espera de que uma estrela viesse morder o seu anzol.
Marina Colassanti
Subscrever:
Mensagens (Atom)